Diabetes tipo 2: fármacos para além da
metformina
· Centro de Estudos de
Medicina Baseada na Evidência – CEMBE – Junho de 2017
o
QUESTÃO CLÍNICA
Qual a eficácia e segurança da monoterapia
com metformina em comparação com a sua associação a outros agentes, nos adultos
com diabetes mellitus tipo 2?
DESCRIÇÃO DO ESTUDO
Metanálise de um total de 204 estudos com
durações entre os 3 meses e os 8 anos (22 deles com mais de 2 anos), com 81%
desses sendo controlados e randomizados, que avaliaram comparativamente várias
medicações (metformina, tiazolidinedionas, sulfonilureias, inibidores da DPP-4,
inibidores do SGLT-2 e agonistas do receptor GLP-1) para diabetes mellitus (DM)
tipo 2 em monoterapia ou em combinação com metformina. Os restantes eram
estudos observacionais, que contribuíram para a avaliação dos fatores confundidores.
Aproximadamente 65% dos estudos incluídos eram duplo-cegos, as perdas no
seguimento foram superiores a 20% na maioria dos estudos e os participantes
incluídos foram adultos diabéticos tipo 2, com excesso de peso ou obesidade e
hemoglobina glicada (HbA1c) entre 7-9%.
OUTCOMES
Primários:
· Mortalidade por todas
as causas
· Complicações
macrovasculares
· Complicações
microvasculares
Intermédios:
· HbA1c
· Peso corporal
· Pressão arterial
sistólica e frequência cardíaca
De segurança:
· Hipoglicémia
· Efeitos secundários
gastrointestinais
· Efeitos adversos
específicos dos inibidores de SGLT-2
· Insuficiência cardíaca
congestiva
RESULTADOS
Quanto aos outcomes primários, existe
evidência de qualidade moderada sugerindo uma menor mortalidade cardiovascular
a longo prazo com a metformina, em comparação com as sulfonilureias em
monoterapia. A evidência foi de baixa qualidade ou insuficiente para analisar
os restantes fármacos.
Quanto aos outcomes intermédios, a maioria
das medicações analisadas proporcionaram uma redução equivalente na HbA1c, com
excepção dos inibidores da DPP-4 que proporcionaram uma redução menor em
comparação com a metformina ou com as sulfonilureias. As tiazolidinedionas e as
sulfonilureias foram associadas a um aumento do peso em comparação com o
restantes agentes. Os inibidores do SGLT-2 e agonistas do receptor GLP-1
reduziram a pressão arterial sistólica em 3 a 5 mmHg sem aumento concomitante
da frequência cardíaca.
Quanto aos outcomes de segurança,
verificou-se um risco aumentado de hipoglicemia com as sulfonilureias, de
efeitos secundários gastrointestinais com a metformina e os agonistas do
receptor GLP-1, de insuficiência cardíaca congestiva com as tiazolidinedionas e
de infeção genital com os inibidores do SGLT-2.
CONCLUSÕES
A evidência continua a suportar o uso de
metformina como terapêutica de primeira linha na diabetes tipo 2, mas ainda não
é suficiente para tirar conclusões sobre as restantes terapêuticas disponíveis
em monoterapia nem como adjuvantes à metformina.
Em 2014, a OMS reportou que 8,5% da
população mundial com mais de 18 anos tinha Diabetes Mellitus, tendo a
prevalência desta doença mais que duplicado nas últimas 3 décadas e sendo
responsável por mais de 1,5 milhões de mortes anuais. No entanto, o tratamento
da DM tipo 2 continua controverso, com a metformina recomendada como
terapêutica de 1ª linha custo-efetiva e com vários outros fármacos sugeridos
mas sem indicações conclusivas quando o controlo glicémico não é obtido.
Em concordância com as atuais guidelines
de tratamento da DM, esta metanálise veio uma vez mais demonstrar a falta de
evidência científica e de ensaios clínicos de alta qualidade para fazer
recomendações sobre os fármacos anti-diabéticos adjuvantes, além de reforçar a
eficácia e segurança da metformina. Embora tenham sido incorporados 204 estudos
nesta análise, não foi possível tirar conclusões para os outcomes primários (mortalidade
e complicações micro- e macrovasculares) com as diferentes classes de
adjuvantes.
Várias limitações foram apontadas pelos
autores, nomeadamente: apenas 65% dos estudos são duplo-cegos, e dentro desses
a maioria não reportou que medidas utilizou para garantir esta característica;
quase metade dos estudos não incluiu a raça/etnia dos participantes, e a
maioria excluiu a população idosa e com comorbilidades significativas; existiu
um elevado número de perdas durante o seguimento (>20%); aproximadamente 67%
dos estudos receberam financiamento de companhias farmacêuticas. Além disso,
esta metanálise teve apenas em conta as classes farmacológicas e não as
possíveis diferenças entre fármacos da mesma classe que contribuem para a
heterogeneidade dos estudos analisados.
Na ausência de melhores evidências, os
autores sugerem por isso que a decisão da terapêutica adjuvante à metformina
seja feita com base nas evidências de qualidade moderada que existem
atualmente, nas comorbilidades do doente, nas preferências e tolerância do
doente e preferência do médico quanto ao perfil de eficácia e segurança de cada
fármaco (HbA1c, aumento de peso, hipoglicemia, efeitos gastrointestinais) e nas
considerações logísticas, nomeadamente forma de administração e custo do fármaco.
Porque os estudos incluídos foram de curta
duração (máximo de 8 anos), não foi possível tirar conclusões a longo prazo,
nomeadamente para os outcomes de segurança. A curto e médio prazo, as
conclusões retiradas dos efeitos adversos farmacológicos podem ajudar na
orientação da escolha da terapêutica adjuvante.
Esta metanálise suporta a sugestão para a
realização de estudos observacionais de alta qualidade num futuro próximo, que
permitam concluir sobre a eficácia e segurança dos fármacos anti-diabéticos e
que venham trazer mais objetividade à terapêutica desta doença comum e mortal.
Autores: Juan Rachadell Pereira, Raquel
Vareda Alves ,
António Vaz Carneiro


